“Dois pesos, duas medidas”

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Antonio Gavazzoni

Quando estão em dificuldades financeiras, grandes empresas têm a opção de recorrer ao Governo Federal para parcelar seus tributos. Muitas vezes, conseguem até perdão de parte das dívidas por meio de programas de refinanciamento, os famosos Refis – um artifício que, diga-se de passagem, favorece o mau contribuinte e deseduca o bom. São agentes privados – algumas vezes instituições bancárias – para os quais o Governo Federal oferece subsídios, postergação de impostos, modificação de alíquota, etc. Desses devedores, a União cobra a taxa Selic acumulada mensalmente com capitalização simples. Não vincula o benefício ao custo de captação dos títulos públicos federais. Seria justo, se não fosse um tratamento diferenciado em relação ao dado aos entes federados.

Quando a dívida é dos estados, a União cobra juros compostos. E os Estados, que não auferem lucro e, conhecidamente, estão enfrentando sérias dificuldades financeiras, veem a conta crescer a perder de vista. Na nota técnica que a União redigiu para contestar a “tese de Santa Catarina”, que defende o fim da cobrança de juro sobre juro, o caso foi tratado como um “erro matemático” com “efeito devastador no tempo”. Está claro para nós que não existe erro matemático, mas sim diferença de metodologia empregada para os cálculos. Uma para quem gera lucro (bancos, empresas, etc) e outra para os subnacionais (estados e municípios).

Trazendo o exemplo para mais perto da vida do leitor, tomemos o Imposto de Renda, que está agora no prazo de declaração. Temos a possibilidade de pagá-lo em seis parcelas. Se tomarmos como base apenas R$ 1.000,00, aplicarmos sobre este valor as taxas Selic de forma simples e de forma capitalizada, já veremos significativa diferença de valor – isso considerando apenas um período bem curto, de seis meses. Agora levemos esse exemplo para as dívidas dos estados com a União, cujos valores são na casa dos bilhões e os prazos de pagamento são estendidos há décadas. Para se ter uma ideia, os estados refinanciaram com a União R$ 119,8 bilhões, já pagaram R$ 294,3 bilhões e ainda devem R$ 463,38 bilhões. No caso de Santa Catarina, a dívida era de R$ 4 bilhões em 1998; R$ 13 bilhões já foram pagos e ainda deveríamos R$ 9 bilhões. É desanimador. E isso acontece por conta dessa taxação injusta, que utiliza o anatocismo, ou juro sobre juro. Para nós, isso significa ter a dívida quitada ou ainda dever bilhões. Conforme a fatura enviada pela União, somente pela parcela de fevereiro devemos R$ 89 milhões. Com esse dinheiro, de apenas um mês, seria possível construir 18 escolas para 1,2 mil alunos em média; ou pagar todas as despesas com custeio do Hospital Celso Ramos por seis anos; ou ainda, concluir o programa Bem-te-vi da Segurança Pública, instalando centrais de videomonitoramento urbano em 184 municípios catarinenses que ainda não dispõem dessa estrutura. Projete-se isso para um ano e chegamos à casa do bilhão.

Por tudo isso, se conseguirmos convencer a União que a tese de Santa Catarina é uma forma de justiça, teremos uma vitória sem precedentes. Um marco para a rediscussão do tema dívida e um ponto de partida para um novo pacto federativo. A União não pode se comportar como banco no tratamento dado a seus entes. Não se trata de briga política, mas de uma questão de justiça. Todo catarinense deveria torcer para dar certo. É do nosso dinheiro que estamos falando.

Por:Antonio Gavazzoni

Doutor em Direito Público e secretário de Estado da Fazenda
contatogavazzoni@gmail.com

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