Parlamento catarinense discute alternativas para conter crise no setor leiteiro

Assembleia debate crise do leite em Santa Catarina buscando medidas emergenciais junto ao governo federal para proteger produtores.

Santa Catarina vive, em 2025, uma grave crise no setor leiteiro, que afeta diretamente a economia rural e a sobrevivência de mais de 30 mil famílias produtoras. Preocupada com essa situação, a Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), por meio da Comissão de Agricultura e Desenvolvimento Rural, realizou, na noite de quarta-feira (12), uma audiência pública para debater a crise e buscar soluções conjuntas.

O encontro reuniu deputados estaduais, representantes do governo estadual, Sindileite, Ocesc, Faesc, cooperativas e produtores rurais, e teve como objetivo discutir medidas emergenciais, como o controle das importações, o apoio financeiro temporário e o incentivo à industrialização e à agregação de valor ao leite produzido no estado. O auditório Antonieta de Barros ficou lotado por trabalhadores que carregavam no peito um adesivo dizendo: Luto pelo Leite.

Queda no preço e desestímulo à produção

Nos últimos meses, o preço pago ao produtor despencou de cerca de R$ 2,40 para menos de R$ 1,80 por litro, valor que não cobre os custos de produção, pressionados pelo aumento do preço do milho, do farelo de soja, da energia elétrica e do transporte. Segundo dados da Epagri/Cepa, o estado registrou uma queda superior a 10% na produção em relação ao mesmo período de 2024, reflexo do desestímulo e do abandono da atividade por pequenos agricultores.

Ações e encaminhamentos

Durante a abertura da audiência, o presidente da Alesc, deputado Julio Garcia (PSD), destacou a importância do encontro como mais uma demonstração da preocupação do Parlamento estadual com os principais temas que afetam Santa Catarina. “O objetivo desse encontro é o debate, é buscar soluções conjuntas para o problema do baixo preço do leite, que vem massacrando os produtores rurais catarinenses. O tema será levado também à bancada federal, por meio do Fórum Parlamentar Catarinense, a fim de sensibilizar o governo federal e acelerar medidas de apoio ao setor.”

Garcia ainda destacou que “Santa Catarina é um estado essencialmente agrícola e um dos pilares do agronegócio nacional. Portanto, a união entre produtores, parlamentares e instituições é o caminho para encontrar soluções práticas e eficazes para o setor leiteiro”, comentou.

Panorama nacional e propostas

Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), o preço médio nacional do litro de leite pago ao produtor apresentou forte queda nos últimos meses, passando de R$ 2,66 em outubro de 2024 para R$ 2,22 em 2025. A redução preocupa o setor e tem provocado prejuízos expressivos aos produtores catarinenses, responsáveis por cerca de 8% da produção nacional.

deputado Altair Silva (PP), presidente da comissão realizadora do evento e também propositor da audiência, destacou que a situação é urgente e exige ações coordenadas entre governo e setor produtivo. “O produtor de leite está no limite. Juntos, debatemos e ouvimos saídas para os mais de 20 mil produtores catarinenses. Somos o quarto estado em produção nacional e não podemos permitir que essa crise comprometa uma das cadeias mais importantes do nosso agronegócio. É hora de unir forças para garantir que o leite continue sendo sinônimo de sustento, dignidade e desenvolvimento no campo catarinense”, comentou o parlamentar. “Estamos trabalhando para que o projeto do leite em pó seja aprovado nos três estados do Sul.”

Importações e concorrência desleal

Outro fator agravante é a entrada de leite importado de países do Mercosul, especialmente Argentina e Uruguai, que chega ao mercado brasileiro a preços até 30% mais baixos. Essa concorrência desleal tem levado laticínios locais a reduzir a compra de leite catarinense, ampliando o prejuízo dos produtores.

O presidente da Alesc, Julio Garcia, ainda destacou, em sua fala, a celeridade que a Casa dará ao Projeto de Lei 768/2025, de autoria dos deputados Altair Silva e Oscar Gutz (PL), que proíbe a reconstituição de leite em pó importado para comercialização como leite fluido em Santa Catarina, como medida emergencial para auxiliar o setor.

Projetos em tramitação

Em Brasília, também tramita um projeto de lei que busca amenizar o problema da entrada de leite importado. O PL 4309/23, da deputada federal Daniela Reinehr (PL-SC), objetiva a proibição da importação e reidratação de leite em pó para venda como leite líquido no Brasil. A proposta visa proteger a produção nacional de leite contra importações mais baratas. “Tramita na Câmara dos Deputados um projeto de minha autoria que proíbe a reidratação do leite em pó na indústria. Essa foi a medida mais eficiente para resolver essa situação”, pontuou.

Depoimentos e preocupações do setor

O deputado Oscar Gutz, também propositor da audiência, ressaltou a importância da união entre o Parlamento e os produtores rurais na busca de soluções para o setor leiteiro. “Estamos sempre juntos fazendo o melhor que podemos pela população, especialmente pela agricultura. Sou agricultor e sei da realidade de quem levanta todos os dias às cinco da manhã, sem folga, para garantir o sustento da família. O produtor de leite está no limite. Com o preço atual, abaixo de dois reais, muitos não conseguem mais se manter. Nossa missão é ajudar quem produz, quem sustenta o campo e a economia catarinense. Esperamos que o governo federal faça a sua parte e que, juntos, possamos tirar o produtor dessa situação tão difícil”, concluiu.

Santa Catarina é o quarto maior produtor de leite do país. Só em 2024, o estado produziu cerca de 3,3 bilhões de litros de leite, 100 milhões de litros a mais do que em 2023, segundo a Pesquisa da Pecuária Municipal do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Visão do setor produtivo

O presidente do Sindileite, Selvino Giesel, alertou, durante seu pronunciamento, que o setor leiteiro brasileiro enfrenta uma “tempestade perfeita”, marcada por uma combinação de fatores que têm gerado forte crise econômica para produtores e indústrias. Segundo ele, houve um aumento da produção de leite em todo o país, impulsionado pela melhora das condições registradas no ano passado. No entanto, o consumo interno está em queda e deve reduzir ainda mais até o fim do ano, período em que historicamente há menor demanda por produtos lácteos.

“Atualmente, 80% dos produtos lácteos são comprados por famílias com renda de até R$ 3,5 mil por mês. Isso mostra a dificuldade que a população está enfrentando, o que se reflete diretamente nas vendas. As importações, que vinham estabilizadas em setembro e outubro, aumentaram significativamente, colocando um volume muito grande no nosso mercado. É importante ressaltar que, entre os dez maiores importadores de leite em pó e UHT, nenhum é uma indústria de laticínios”, criticou.

Medidas sugeridas

De acordo com ele, tanto os produtores quanto as indústrias estão operando com prejuízo. “Hoje, o leite UHT gera cerca de R$ 0,35 de prejuízo por litro produzido. Os estoques estão altos, há pressão para vender mais barato e, mesmo assim, o preço ao consumidor final não reflete as quedas impostas ao produtor e às indústrias”, explicou.

O presidente do Sindileite defendeu medidas urgentes para conter a crise. “Precisamos que o governo federal atue com rigor na fiscalização e na auditoria sanitária das importações. Quando exportamos, somos obrigados a cumprir uma série de exigências. O mesmo deve valer para os produtos vindos da Argentina e do Uruguai, que chegam ao país sem a mesma certificação”, apontou.

Ele também sugeriu ações emergenciais para reduzir o impacto da crise. “O governo poderia comprar leite em pó para diminuir os estoques e suspender temporariamente as importações, como medida de equilíbrio do mercado”, concluiu.

Voz dos produtores

A produtora de leite da cidade de Iomerê, Talita Casagrande, emocionada, enfatizou o trabalho dos agricultores e a busca por dignidade. “Sou produtora de leite por paixão. Minha família é a terceira geração e os meus filhos ajudam a tocar. A gente montou uma estrutura, que tem sanidade nos animais, propriedade certificada, temos uma excelente qualidade, só que isso custa. E, com essa crise, como vamos dar a volta nas contas? O produtor de leite só quer dignidade, só quer pagar suas contas e não encher a paciência de ninguém. A gente só quer ir pra casa, pagar nossas continhas, não dever pra ninguém e não incomodar ninguém. Produtor de leite não quer nada, só quer dignidade”, comentou.

Formação de comissão

Encerrando a audiência pública, foi criada uma comissão que trabalhará estrategicamente junto ao governo federal e ao governo catarinense nas sugestões indicadas durante o amplo debate.

Confira os membros que farão parte: Os deputados estaduais Altair Silva e Oscar Gutz; o presidente da Faesc, José Zeferino Pedroso; a presidente da Uvesc, Marcilei Vignatti; os prefeitos Chico Folle, de Xaxim; o secretário de Estado da Agricultura, Carlos Chiodini; e o deputado federal Valdir Cobalchini (MDB-SC).

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