A saída temporária, popularmente conhecida como “saidinha”, trata-se de um direito do cidadão que se encontra cumprindo pena em unidades prisionais. Essa benesse está prevista na Lei nº. 7.210, de 11 de julho de 1984, Lei de Execuções Penais, conhecida também como LEP.
O referido direito é concedido durante o processo de execução penal e consiste na liberdade temporária do detento que preencha os requisitos previstos em lei.
Atualmente as saídas objetivam tão somente que o indivíduo possa frequentar algum curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução do 2º grau ou superior, na Comarca do Juízo da Execução de sua pena.
Observa-se na LEP que o tempo da saída será tão somente o necessário para o cumprimento das atividades discentes, podendo estas serem referentes ao estudo em um curso profissionalizante ou de instrução de ensino médio ou superior. Ademais, por motivos de política criminal, ou seja, organização do Estado, as datas da saída são predefinidas e devem ser requeridas com antecedência.
Nessa toada, importante esclarecer que a pena é uma espécie de sanção penal, a qual pode constituir na privação ou restrição de determinados bens jurídicos do condenado, inclusive na liberdade. Essa penalidade é aplicada pelo representante do Estado, ou seja, o Juiz competente para realizar o determinado julgamento.
Insta mencionar que a sanção tem como finalidade a de punir condutas delituosas praticadas pelo autor do fato, bem como objetiva readapta-lo para o convívio em sociedade e, mediante o demonstrativo e intimidação da advertência para com a comunidade, busca prevenir a prática de novos crimes ou contravenções penais. Devendo a pena atentar-se as necessidades da coletividade, combatendo a impunidade e recuperando os condenados para o retorno ao convívio social.
Isto posto, a pena privativa de liberdade, prevista no artigo 32, inciso I, do Código Penal, consiste na modalidade de sanções penais que restringem a liberdade do cidadão, retirando-lhes o seu direito constitucional de locomoção, recolhendo o reeducando ao estabelecimento prisional para que futuramente possa retornar ao convívio em sociedade.
Nesse viés, observa-se que no artigo 112 caput, da LEP, consta a previsão de que a pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva. Logo, à medida que os detentos alcançam o lapso necessário para a garantia do benefício e atendem a requisitos imprescindíveis para o deferimento do pedido, estes passam a usufruir das benesses previstas na Lei de Execuções Penais.
Recentemente houve uma significativa alteração no direito da saída temporária, uma vez que houve a promulgação do PL 2.253/2022, transformando-se em norma jurídica, sendo a Lei nº 14.843, de 11 de abril de 2024, denominada de Lei Sargento PM Dias. Destaca-se que essa lei entrou em vigor no dia da sua publicação, ou seja, dia 11 de abril de 2024.
Dessa forma, antes da atual reforma, a saída temporária se aplicava aos condenados que cumprissem pena em regime semiaberto, desde que para: a) visitar à família; b) frequentar a curso supletivo profissionalizante ou de instrução do segundo grau ou superior; e c) participar em atividades que concorram para o retorno ao convívio social.
Ademais, a lei também previa que o reeducando poderia sair até cinco vezes ao ano, sendo que, cada uma dessas saídas seria no máximo de sete dias.
Todavia, conforme já mencionado, a recente norma prevê que o indivíduo somente poderá usufruir da saída temporária para frequentar algum curso supletivo profissionalizante, podendo este ser de 2º grau ou superior. Ainda, o tempo da saída será tão somente o necessário para o cumprimento das atividades discentes. Além disso, não terá direito à saída temporária o condenado que cumpre pena por praticar crime hediondo, com violência ou grave ameaça.
Em concordância com a lei anterior, a autorização será concedida por ato motivado do Juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária e dependerá da satisfação de determinados quesitos, sendo eles: a) comportamento adequado, este sendo analisado e julgado pelo diretor da unidade prisional que irá avaliar a conduta do reeducando ; b) o cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena, se o condenado for primário, e 1/4 (um quarto), se reincidente; e, c) a compatibilidade do benefício com os objetivos da pena.
Outrossim, além das polêmicas alterações, surgiu o questionamento jurídico se as novas medidas deveriam ser aplicadas aos detentos que já se encontravam na eminência de usufruir essa benesse, uma vez que a Constituição Federal (5º, inciso XL) institui que a lei penal brasileira não pode retroagir, salvo para beneficiar o réu, o que não é o presente caso, visto que a nova norma é notavelmente mais rigorosa (novatio legis in pejus).
Nesse sentido, no julgamento do Habeas Corpus n. 240.770/MG, o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal, estabeleceu que a medida penal não deverá retroagir aqueles indivíduos que cumpriram delitos antes da promulgação da nova lei, uma vez que o direito penal se orienta pelos princípios fundamentais da legalidade e da anterioridade, segundo os quais não há crime nem pena sem prévia cominação legal.
Não obstante, apesar do mencionado julgamento ser condizente com a Constituição Federal e prever o básico dos direitos fundamentais, não há ainda um entendimento concreto, uma vez que o mencionado julgamento foi realizado tão somente de forma monocrática.
Conclui-se, portanto, que muito em breve o judiciário estará abarrotado de recursos discutindo a mencionada norma e até mesmo a sua constitucionalidade, uma vez que notoriamente identifica-se como uma norma penal em branco. Dito isso, observa-se a incontestável omissão legislativa em relação aos sujeitos que já possuem uma condenação com trânsito em julgado, bem como para aqueles que o processo se encontra ainda em fase de julgamento, e por fim, para os crimes cometidos após a mudança da lei.
Por:
GABRIELLE ZACHOW
Advogada – OAB/SC 70.468
*Coluna ‘OAB em Destaque’, publicada no Jornal O Celeiro, Edição 1840 de 01 de Agosto de 2024.